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Nota Artística
José Bragança

O povo gosta é da Nota artística

2016/12/13
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"Nota artística" é um espaço de opinião, com jogadas soltas, da autoria de José Bragança, jornalista do zerozero.

Nota artística. A coisa desenrola-se mais ou menos assim. Da rua onde todos, ou quase todos, vamos dando os primeiros pontapés na bola (quando duas pedras ou as mochilas fazem de baliza e bom), passando pela escrita, onde queremos fazer a coisa bonitinha para os senhores leitores. 

Nota artística também nos exames da faculdade que, no seu tempo, nos obrigavam a "jogar bonito", embora a malta só queria jogar para o "pontinho". Nota artística mora, porém, em todo lado. Vejam lá, caros amigos, que agora até está no dicionário do futebol, obra e graça de Jorge Jesus, justiça lhe seja feita. E não me venham dizer que futebol é só um jogo, que aquilo não conta para nada ou é uma coisa menor. Treta!

Toda a gente (ou quase toda) gosta de futebol e com Nota artística. Nunca vos aconteceu lançar aquele olhar desconfiado - bem mais do que quando o Ministro das Finanças quer falar ao país - para quem não gosta de futebol? Sou sincero, comigo é assim. 

Convém, desde já, falar abertamente ao que vamos. Eu gosto do futebol sem filtros e do futebol com coração. Gosto de estádios cheios (ao barrote, como se diz na minha terra). Sim, é verdade, eu tenho saudades da Liga dos Últimos (que nos falava dos clubes da distrital), tenho saudades de estar aos domingos de ouvido colado no rádio a ouvir um relato de um Estrela da Amadora x Salgueiros, ou de um Leça x Campomaiorense. E do Domingo Desportivo? [Pausa] tantas.

Nota artística era acabar o domingo com estes programas de rádio e tv na ponta da língua e na raiz do pensamento. Tudo sabidinho. No dia seguinte chegava à escolha e falava do Serifo, do Febras, do Noverça ou do Poejo como se fossem amigos lá de casa. Nota artística era tudo isso e muito mais, caramba.

Mais tarde ou mais cedo quero acreditar que voltaremos ao que já fomos. Ao futebol à antiga (com o respetivo desenvolvimento que é inevitável), embora não acredite que os jornalistas, por exemplo, possam voltar a falar abertamente no fim dos treinos com os jogadores ou possam ir comer um éclair no bar do estádio com eles. As coisas mudaram. Nem tudo é mau mas perdeu-se a Nota artística. Agora é tudo previsível. Os guarda-redes já não vão de boné para a baliza, os jogadores vão com chuteiras às cores e não com aquelas pretinhas, já não se faz o sorteio da bola ao intervalo (ou do presunto). As conferências dos treinadores já quase as conseguimos antecipar. Os jogadores são obrigados a dizer pouco e ficam presos ao básico. Só nos dizem que estão "felizes porque estão contentes". E tantas histórias engraçadas e curiosas, por vezes, têm para contar.

Como o jornalista Carlos Daniel escreveu um dia nas páginas do Diário de Notícias, o "futebol também se conjuga noutro infinitivo que não ganhar: é preciso gostar". No futebol como na vida, ganhar ou perder faz parte. Mais importante que ganhar ou perder são as lembranças e a beleza das coisas. A tal Nota artística que o futebol nos deixa na memória. Afinal, o que seria da vida sem elas? 



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