Comissões, mais-valias, mecanismo de solidariedade, partilha dos direitos desportivos. Ora, dois vezes quatro igual a oito, subtrair sete, multiplicar por cinco e, sim senhor, temos negócio.
No trono do presidente da SAD, e da entourage que o rodeia, o futebol é a máquina de fazer e desfazer dinheiro, de salivar a ponta dos dedos para contar notas e partilhar lucros. Mesmo quando eles não existem.
Para estas mentes, o sucesso desportivo, as vitórias e a alegria genuína do povo são pontos subalternos numa cadeia alimentar que não poupa ninguém. Nem o melhor futebolista do plantel.
Vem a reflexão a propósito da venda apressada e atabalhoada de Luis Díaz. Sim, o craque que fazia a diferença, o homem que desbloqueava jogos e deixava o FC Porto um bocadinho mais perto de ser campeão nacional.
O modelo de gestão da SAD azul e branca é um chorrilho de pecados e erros primários. Um logro. O rol de decisões estapafúrdias, e financeiramente castradoras, é de tal ordem assustador que conduziu o clube a este beco sem saída: ou vendia Díaz já em janeiro ou não havia liquidez para saldar dívidas prementes com a UEFA (recorro ao O Jogo, publicação normalmente bem informada sobre a vida interna do clube).
Os 45+15 milhões são uma ilusão, como foram há anos os 120 milhões de João Félix na casa da Luz. Contas feitas, e descontando todos os pedacinhos que o primeiro parágrafo elenca, nos cofres da SAD entrarão pouco mais de 30 milhões de euros. Uma pechincha.
Ninguém na estrutura do FC Porto achou por bem investir nos 20 por cento de Díaz que ainda pertenciam ao Junior Barranquilla? Não.
Nenhuma alma próxima ao presidente o alertou para as palavras (públicas) do seu administrador financeiro em janeiro de 2016, logo após a venda à PT/Altice dos direitos televisivos do clube por 457,5 milhões de euros? Não.
«A partir de agora podemos vir a deixar de ter de tomar decisões sob pressão. O negócio permite gerir o clube de outra forma, mais objetiva económica e financeiramente e sem estar tão dependente dos ganhos ocasionais em janeiro e no final da época.»
Seis anos depois, é já seguro afirmar que Fernando Gomes se enganou e, indiretamente, enganou os portistas. Além de ter havido a necessidade de antecipar grande parte da milionária verba, o clube chega a este ponto sem retorno: vender a estrela da companhia para poder cumprir com obrigações financeiras urgentes. Inaceitável.
Volto ao desabafo de Sérgio Conceição: não há planeamento, há desenrasque; não há estratégia, há o salve-se quem e como puder. No meio disto tudo, salvam-se o treinador, equipa técnica, futebolistas e staff do plantel profissional.
É um milagre que em janeiro de 2022 o FC Porto consiga ser a mais capaz e competitiva equipa do futebol português.
PS1: o regresso de Galeno ao FC Porto. Saiu por 3,5 milhões de euros, voltou por nove. E nem me pronuncio sobre as percentagens dos direitos económicos e desportivos, pois os comunicados dos dois clubes sobre a transferência não batem certo. Sai o génio Díaz, entra um atleta fortíssimo em alguns aspetos - velocidade, aceleração, remate - e péssimo noutros - decisão, estabilidade emocional.
PS2: acabo como comecei. Comissões, mais-valias, mecanismo de solidariedade, partilha dos direitos desportivos. Alguém nos dê uma lição de contabilidade, porque isto de futebol já tem muito pouco. Desisti de perceber.
* Chefe de Redação do zerozero
«Como existe pouco planeamento ou não há, temos de rever esses mesmos objetivos.»