* Chefe de Redação
A estratégia é esta: contratar muito, abundantemente, desfazer plantéis, esperar o Santo Graal dos euros em algum dos reforços, rezar aos santinhos da fortuna por uma transferência futura.
Apagar e reformular, dispensar e comprar. O critério? Difícil de entender.
Ao ver o Portimonense na Luz, passava-me pela cabeça uma série de dúvidas, sensações em loop, um disco riscado em cada jogo visto do brioso emblema algarvio.
O que pretende este projeto desportivo, afinal?
O futebol da equipa é pobre, oscila entre o razoável e o penoso. Muito jogo direto, uma decente organização defensiva, alguma concentração competitiva e pouco mais.
Exceção feita ao competente Filipe Relvas, não identifico um nome entusiasmante, alguém capaz de chegar a patamares superiores e fazer a diferença.
Hélio Varela? Muito dificilmente.
Paulo Sérgio, treinador com um currículo de bons trabalhos em Paços de Ferreira, Guimarães e Edimburgo, além da passagem pelo Sporting, aparenta um conformismo difícil de perceber para quem manda numa equipa que tão pouco joga.
É provável até que a manutenção seja alcançada, como tem sucedido nas últimas épocas, mas não há ponta de brilho, de afirmação com bola, de coragem para pressionar em zonas altas e mandar nos jogos.
É uma equipa desinteressantíssima, para ser simpático, incapaz de valorizar os recursos humanos ao dispor do técnico.
A SAD, dominada por Theodoro Fonseca desde a época 13/14, começou bem. Investiu em infraestruturas, dotou o futebol profissional de condições invejáveis para o trabalho diário, subiu à I Liga (2017) e identificou nomes de nível insuspeito: Lucas Fernandes, Ewerton, Paulinho, Nakajima, Carlinhos, Beto…
Nomes incomparavelmente superiores ao do elenco atual. Muitas caras novas (18 só para a equipa principal, desde o verão passado, mais 21 na época passada e 14 na anterior), um entra e sai desgovernado, um investimento aparentemente estagnado e a aguardar ventos de maior inspiração.
Portimão é terra de futebol e o Portimonense Sporting Clube é um emblema fantástico, dono de um ADN rijo, casa de nascimento e/ou de passagem de nomes inesquecíveis: Serge Cadorin, Skoda, Vado, Floris Schaap, Pacheco, Rui Águas, César Brito, cromos da elite nacional, símbolos maiores da camisola alvinegra, sempre listada e embelezada por calções negros.
Passar na fortaleza algarvia era tarefa hercúlea. Lembro-me bem de um resumo no Domingo Desportivo, gente a ver a receção ao FC Porto literalmente em cima do relvado, a notícia de pedras atiradas à comitiva azul e branca, exageros próprios de quem ama irracionalmente o clube da terra.
Em 23/24 o panorama é distópico, a paixão escapou-se. Média de 1.945 pessoas no estádio, a segunda pior do campeonato, uma taxa de ocupação de 39 por cento, a incapacidade de convencer uma boa fatia dos 50 mil portimonenses a ir ao futebol.
Estou a 600 quilómetros do epicentro do clube, faltar-me-á informação para ser mais rigoroso, quiçá mais justo, para analisar a situação no todo. À distância, esta é a imagem que me chega.
No Football Manager é tudo fácil. Implodimos o plantel, erigimos um novo a nosso bel-prazer e o worst case scenario obriga-nos, no máximo, a um novo save. Mas isto é a vida real e o futebol profissional.
Brincar a jogos de simulação não é uma boa ideia. Há muito em jogo, a começar na ligação à comunidade e na responsabilidade financeira. O projeto do Portimonense só pode dar o próximo passo – cheirar a Europa? – se tiver um plantel mais competitivo e um treinador insatisfeito por natureza.
Paulo Sérgio foi capaz de estabilizar a equipa na I Liga. O homem certo para essa tarefa, dizem os números, os mesmos que gritam por uma mudança a curto prazo.
Em Portimão já tudo parece poucochinho para uma ideia que tanto prometeu. Ninguém lê as letras pequeninas, nem a jogar Football Manager.