A equipa do Arsenal de 2003/04 é icónica por vários motivos. Não só foi a equipa vencedora da Premier League, como o fez de maneira invencível, algo que dificilmente será repetido. A história dos pupilos de Arsène Wenger foi escrita por várias figuras do futebol mundial. Thierry Henry, Robert Pirès, Lehmann, Ljungberg e até Bergkamp foram figuras regulares nos Invincibles, mas, se há nome que nunca escapará a nenhuma versão da história, é o do capitão Patrick Vieira.
Construído como uma «aranha gigante», como dizia o colega de equipa Tony Adams, devido ao físico do francês, Patrick Vieira dominava o campo. Com 1,93m de altura, pernas compridas, e um pulmão que não parecia terminar, o francês corria durante 90 minutos por todo o lado, ganhando duelos defensivos, mas não só. Vieira era o protótipo do médio box-to-box, pois não só era forte nas tarefas defensivas e recuperação de bola, como também era excelente a nível técnico, garantindo várias soluções à equipa no ataque.
Nascido em Dakar, no Senegal, filho de uma mãe cabo-verdiana (origem do seu apelido português), e com passagens pelos campeonatos de Itália e, claro, Inglaterra, Patrick Vieira foi um símbolo não apenas do futebol, como da globalização do mundo. Chegou a França com oito anos e não foi preciso muito tempo para descobrir que o futuro estava nos seus pés.
Com apenas 17 anos, estreou-se profissionalmente pelo Cannes, mas a idade não foi desculpa para o jovem Patrick Vieira se esconder no futebol do primeiro escalão francês, pelo contrário. Rapidamente se estabeleceu como uma das figuras da equipa e não foi preciso muito tempo para se estabelecer como o capitão.
Com as exibições regulares na Ligue 1 vieram as convocatórias para as seleções jovens de França. Jogou no Euro sub-21 em 1996, onde foi companheiro de outras futuras estrelas como Robert Pirès, Claude Makélélé e Sylvain Wiltord, e onde a equipa francesa se ficou pelo terceiro lugar após eliminação frente à Itália, os posteriores vencedores.
A história no sul de França não foi, ainda assim, particularmente longa. Menos de dois anos passados desde a sua estreia, Vieira recebeu um convite do AC Milan, onde iria encontrar um plantel recheado de talento. Não só a equipa de Fabio Capello tinha a melhor defesa do mundo como ainda contava com nomes como Donadoni, Baggio, Futre e Weah do meio-campo para a frente.
Em Milão durou menos tempo ainda. Os cinco jogos que fez pelo clube foram o suficiente para se sagrar campeão da Serie A pela primeira vez, mas não para superar Frank Rijkaard no miolo rossoneri, pelo que foram precisos apenas seis meses para o médio francês encontrar um novo clube.
Pouco mais de cinco milhões de euros convenceram o AC Milan a libertar o médio francês para satisfazer o pedido expresso do seu compatriota Arsène Wenger, que começava dessa forma a sua primeira temporada nos gunners.
A estreia veio na sexta jornada da Premier League, quando entrou aos 28 minutos de uma partida frente ao Sheffield Wednesday e revolucionou o jogo por completo. Quando o lesionado Ray Parlour lhe deu o seu lugar em campo, o resultado estava 0x1 para o adversário, mas o impacto de Patrick Vieira seria imediato. Desde logo mostrou-se dinâmico no meio-campo, e demasiado forte para os adversários, deixando a sua marca num jogo que o Arsenal venceria por 2x1.
Surgiu naquele dia um médio como nunca antes tinha sido visto em Londres e que teve impacto na rápida ascensão da reputação de Wenger. Nesse ano, a equipa dos gunners, que contava com nomes como Bergkamp, Ian Wright e David Seaman, conquistou um respeitável terceiro lugar, mas, com as chegadas dos reforços Marc Overmars e Emmanuel Petit em 1997, o segundo ano de Patrick Vieira seria mesmo coroado com a conquista da Premier League.
«Ganhar o Campeonato do Mundo no teu país e à frente dos teus adeptos... É algo que só acontece uma vez na vida», afirmou Vieira.
Pela seleção, os bons tempos mantiveram-se. Quando o Euro 2000 começou na Holanda e Bélgica, Vieira já se tinha estabelecido como titular e fazia parte da equipa que garantiu um segundo triunfo consecutivo no cenário internacional.
Durante os anos seguintes, Vieira foi tornou-se gradualmente num dos favoritos dos adeptos no Highbury, e mesmo com os melhores clubes do mundo interessados nos seus serviços, o francês manteve-se leal. Em 2001/02, os gunners investiram em Sol Campbell, central dos rivais do norte de Londres, para reforçar uma defesa envelhecida, decisão que foi aplaudida por Patrick Vieira, que nesse ano gozou uma das suas melhores temporadas enquanto futebolista na caminhada até ao seu segundo título da Premier League. No final dessa época, Tony Adams pendurou as botas, deixando a braçadeira de capitão para o gigante francês.
O ano seguinte seria o último em que Vieira vestiu a camisola do Arsenal, conquistando também o último dos onze troféus que celebrou em nove anos passados no clube. Aquando da sua saída, o francês foi claro, ao assumir que nunca jogaria noutro clube inglês. Mais tarde essa promessa seria quebrada, mas tal não iria afetar o legado de Patrick Vieira em Londres, pois é sem dúvida uma lenda.
Uma coisa que marcou Patrick Vieira em Inglaterra foi, para além das recuperações de bola impossíveis, cavalgadas pelo centro do terreno ou pontapés de meia distância, uma das maiores rivalidades que o futebol já viu. O rival era o inevitável Roy Keane, então capitão do Manchester United.
«Eu sentia sempre que ia para a guerra contra eles de qualquer das formas, então sentia as dores já antes do jogo. Depois não me importava, é para isso que jogamos. O Patrick era o meu adversário mais complicado na altura. Ele desafiava-me de maneiras diferentes. Podia correr o campo todo, bom com a bola, forte, e capaz de marcar um golo», disse Keane alguns anos depois.
Os confrontos repetiram-se muitas vezes ao longo dos anos, mas o mais memorável foi provavelmente o último, em 2005, no antigo estádio do Arsenal. O problema começou ainda antes do jogo, quando desacatos no túnel obrigaram a intervenção do árbitro Graham Poll.
«O Patrick Vieira tem 1,93m e meteu-se com o Neville, então eu disse 'anda lá, tenta comigo', só isso. Mas se tivesse havido uma luta, o Patrick provavelmente conseguia matar-me», recordou o irlandês.
A primeira passagem de Patrick Vieira em Itália deixara bastante a desejar. Claro que era apenas um jovem quando pela última vez tinha jogado na Serie A, mas o sucesso que marcou o resto da carreira levou a que Fabio Capello voltasse a apostar no francês, levando-o para a Juventus num negócio que valeu ao Arsenal 20 milhões de euros.
Para além do título ter sido retirado, a Juve foi despromovida ao segundo escalão, o que levou à saída de vários jogadores. Patrick Vieira foi um deles.
Dessa forma, apenas um ano depois da chegada à Juventus, o francês voltou a ser transferido, dessa vez para o Inter de Milão, que foi o maior beneficiário da situação, ficando não só com o título da Serie A, mas também com um craque como Patrick Vieira a preço de saldo.
Foi dessa forma que chegou ao Manchester City, onde, em ano e meio, fez 46 jogos e marcou 6 golos, antes de pendurar as botas e começar imediatamente a sua vida pós-jogador, com a posição de Chefe de Desenvolvimento de Futebol nos citizens antes do início da carreira de treinador.
Foram 17 anos ao mais alto nível, em que o gigante conquistou praticamente tudo. Para a história fica a glória e os troféus, o legado de um invencível.